Wednesday, June 6, 2007

DVDs: Barry White, Brian Wilson, Steve Morse, Bob Dylan & Ginger Baker



Safra eclética e instigante de DVDs
Lançamentos trazem Barry White, Brian Wilson, Steve Morse, Bob Dylan e Ginger Baker
Arnaldo DeSouteiro

Artigo escrito por Arnaldo DeSouteiros em 26 de Abril de 2007 e publicado originalmente no jornal "Tribuna da Imprensa" em 30 de Abril de 2007

No início do novo milênio, quando outras gravadoras ainda investiam timidamente em DVDs no Brasil, o selo paulista ST2 ousou apostar neste formato como uma prioridade de suas atividades. Este pioneirismo colocou a empresa em privilegiada posição no mercado, com seu catálogo visto com respeito pela concorrência e com seus lançamentos sendo aguardados ansiosamente pelos lojistas e consumidores. Embora o carro-chefe da ST2 seja o vastíssimo acervo do Festival de Montreux, negociado com a Eagle Vision, outras séries como a “Classic Albums” e “Ed Sullivan Shows” também conquistaram público fiel. Mais uma vez provando que não vive só de Montreux, lança agora uma nova safra tão eclética quanto instigante, trazendo títulos focalizando nomes como Barry White, Brian Wilson, Steve Morse, Ginger Baker, Bob Dylan e The Roling Stones.

A marca do estilista

Os inúmeros fãs de Barry White podem matar a saudade do ídolo, de vozeirão inconfundível e balanço inimitável, através de “Let the music play - The Barry White story”, belo documentário dirigido por George Scott. Ou melhor, um retrato íntimo da vida e da carreira do artista. Sua trajetória é contada por meio de imagens de arquivo, depoimentos do próprio ícone e novas entrevistas concedidas especialmente para o DVD por membros de sua família (incluindo a esposa Glodean James, uma das três vocalistas da Love Unlimited) e amigos como o guitarrista Ray Parker Jr.e o baixista Nathan East (integrantes da orquestra), o lendário compositor Smokey Robinson, o jovem Taboo (do Black Eyed Peãs), o produtor Jack Perry, e Russ Regan, manda-chuva da 20th Century Records onde Barry atingiu sua fase áurea.

Autorizado pelos responsáveis pelo legado de Barry White, o filme conta como um garoto pobre do sul de Los Angeles rumou para Hollywood e conquistou o mundo com o assombroso número de 106 discos de ouro e 41 discos de platina, alcançando a marca de mais de cem milhões de discos vendidos. “Let the music play” faz um registro dos primeiros trabalhos de White como compositor e produtor, os altos e baixos de sua trajetória (a fase de decadência nos anos 80, na antiga CBS, que parecia tê-lo tirado da 20th Century Fox apenas para “matar” sua carreira, tal a eficiência com que o deixou sem promoção, jogando para escanteio) e as tristes circunstâncias de sua morte aos 58 anos, em conseqüência de um derrame em 2003, quando padeceu por vários meses em uma cama de hospital.

Dois de seus filhos contam detalhes da armação maquiavélica organizada pela advogada e pela namorada de Barry White, que fizeram de tudo para manter a família à distãncia. Para se ter uma idéia da baixaria, basta dizer que a tal namorada inventou que estava grávida, deu entrevista à BBC depois da morte de White falando sobre a criança, mas no final acabou desmascarada pelo teste de DNA. Barry não era o pai. A seqüência em que conta como teve a idéia de lançar “Love’s theme” em versões vocais e instrumentais que explodiram simultaneamente nas rádios em 1974 é emocionante, assim como as dos dois primeiros álbuns, “I’ve got so much to give” e “Can’t get enough”, que chegaram ao topo da parada pop da Billboard.

A história é ilustrada por trechos de shows (a maior parte vem de uma apresentação na Bélgica) nos quais o craque da soul-music interpreta os clássicos "Let the music play", "Can't get enough of your love babe", "You're the first, the last, my everything" (ainda hoje capaz de lotar qualquer pista de dança em um piscar de olhos), "Never never gonna give you up", "It's ecstasy when you lay down next to me" e o ultimo hit, “Staying power”, faixa-título do excelente álbum lançado em 1999, que não passou do 43º lugar na Billboard mas recebeu dois prêmios Grammy. Nos extras, além dos números ao vivo, imagens do produtor Jack Perry na mesa de estúdio, mexendo separadamente nos canais de base e depois nos de orquestra para mostrar como Barry sabia criar uma base repleta de swing (além do piano acústico ele toca uma linha de “guitarra” no teclado) para, depois, envolve-la em suntuosa orquestração.

Noite heterogênea

Intitulado “MusiCares presents a tribute to Brian Wilson”, um DVD repleto de astros capta o evento realizado em Los Angeles, em 11 de fevereiro de 2005 - duas noites antes da cerimônia de entrega dos prêmios Grammy - para comemorar a escolha de Brian Wilson como a "Personalidade MusiCares do Ano". A escolha reconheceu a contribuição de Wilson tanto para a música quanto para a sociedade, por conta do trabalho humanitário realizado junto a instituições como a Carl Wilson Foundation, que faz pesquisas relacionadas ao câncer, a Adopt- A-Minefield e a Bridge School Benefit Concerts de Neil Young. No palco, um desfile de artistas talentosos, e outros nem tanto, revisitando o repertório do ex-Beach Boys e ajudando a arrecadar uma boa quantia para a MusiCares. A dinheirama, somada à renda obtida com a venda deste DVD, irá financiar programas e serviços da MusiCares, organização que promove uma rede completa de assistência a músicos necessitados.

Uma causa tão nobre merecia um elenco melhor. Os Red Hot Chilli Peppers abrem os trabalhos com uma versão frqauíssima de “I get around”. O espertalhão Jamie Cullum berra e baba no microfone enquanto esmurra as teclas do piano em “Sail on sailor”, número roubado pelas vozes afiadas das garotas do Levite Camp. Em contrapartida, para espanto geral, os Backstreet Boys não fazem feio em “When I grow up to be a man”. Já o que restou do Earth, Wind & Fire (sem Maurice, vitimado pelo mal de Parkinson, mas ainda com Verdine White no baixo) mostra uma leitura a meia-boma de “Don’t talk”. Sobrevalorizado, John Legend esforça-se em “I just wasn’t made for these times”. E não foi mesmo!

O próprio Brian canta os quatro últimos números com a mesma banda que o acompanhou na turnê brasileira de 2004, quando fez antológico show no Jóquei Clube de São Paulo. Porém, os melhores momentos ficam por conta de Darlene Love (“Wouldn’t it be nice”), do espetacular Jeff Beck (“Surf’s up” e “Surfin’ USA”, com o guitar-hero exibindo toda a sua categoria) e do encontro entre Michael McDonald (piano & voz) e o saudoso Billy Preston estraçalhando no órgão Hammond em “Don’t worry baby”. Momento ainda mais comovente quando se sabe que se trata de uma das últimas performances de Preston. Meses depois, vítima de uma pericardite, Preston entraria em coma e nunca mais recobraria a consciência, vindo a falecer em janeiro de 2006.

Sonhos e devaneios

Em 1984, após gravar quatorze álbuns comandando o conjunto The Dixie Dregs (depois rebatizado apenas Dregs), o fantástico guitarrista canadense Steve Morse – influenciado tanto por Jimi Hendrix como por John McLaughlin – montou a Steve Morse Band, impactante power-trio completado pelo baixista Dave LaRue e pelo batera Van Romaine. O precioso DVD “Live in Baden-Baden” traz duas apresentações ao vivo, em março de 1990, para o famoso programa “Ohne Filter Musik Pur” da TV alemã. “Sleaze factor”, “Tumeni notes” (maravilha de título!), “Pride of the farm” e “Cruise Missile” (cujo vídeo aparece nos “extras”) destacam-se no repertório. Vale lembrar que, seis anos depois, Morse teria uma curta, porém nobre, passagem pelo Deep Purple. Fica a dica para que a ST2 lance mais títulos filmados no “Ohne Filter”, onde Tania Maria, Airto & Flora, David Sanborn e o grupo Crusaders fizeram shows memoráveis editados em LaserDisc mas até agora inéditos em DVD.

Completando o pacote, alguns itens surpreendentes. Em 3 de dezembro de 1965, alguns meses depois de ter assombrado Newport, Bob Dylan chegou a San Francisco - um dia antes das apresentações que faria na cidade e em Berkeley - para participar de uma coletiva de imprensa transmitida pela televisão. Pois este é o conteúdo de “Dylan speaks”, com o esperto rapaz de 24 anos entrevistado por personalidades importantes como o poeta beat Allen Ginsberg, o empresário Bill Graham e o musicólogo/produtor/jornalista Ralph J. Gleason, lendário colunista do San Francisco Chronicle, um dos fundadores da revista Rolling Stone e também dono de um programa de TV. Indicado apenas para os fãs mais ardorosos de Bob, obviamente.

Efeito oposto ao proporcionado por “Ginger Baker in Africa”, registro da aventura empreendida pelo baterista do grupo Cream em novembro de 1971. Disposto a instalar um estúdio de gravação em Lagos, então capital da Nigéria, cruzou o Deserto do Saara pilotando um Range Rover, e teve a aventura filmada por Tony Palmer. Um dos primeiros “roqueiros” a perceber o imenso potencial da música africana, o britânico Ginger, de formação jazzística, é visto em incríveis jam-sessions com jovens dançarinas africanas em transe, muitos percussionistas de Oshogbo usando talking-drums e ainda a banda de Fela Kuti em Calabar. Merecendo ser considerado um legítimo pioneiro da verdadeira world-music, Baker embarcou em uma tremenda viagem. Com duplo sentido.

Legendas:
“Documentário revela o processo criativo e a intimidade de Barry White, um mestre da soul-music”
“O baterista Ginger Baker saiu em busca da essência da música africana”

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