Wednesday, July 25, 2007

"Grooves in the Temple" - Interview with Pescara for "TKT" magazine


Interview for TKT Magazine, by Carlos Eduardo Cardoso
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ENTREVISTA COM JORGE PESCARA (TKT 20+) por Carlos Eduardo Cardoso

1) Gravar um CD é o sonho de quase todo o músico. Você encara este trabalho como o ponto maior de sua carreira?
Você está correto, este é o foco de qualquer artista.


2) Você teve a preocupação de participar ativamente da produção do CD. Isto facilitou o trabalho do Jorge Pescara músico?
Não que tenha facilitado meu trabalho, mas por participar tão intimamente da confecção deste produto estou familiarizado com as etapas. Desde o princípio já sabia aonde queria chegar, tenho minha sonoridade na cabeça. A sonoridade geral das canções possui um “algo” de prog-rock, pois o progressivo faz parte da minha preferência musical, principalmente o grupo Gênesis, do qual eu tenho todos os discos de catálogo, além de piratas, vídeos, livros, artigos etc. Por isso eu optei por utilizar somente teclados análogos neste trabalho. Mini-Moog, Wurlitzer, Hammond, Oberheim, Mellotron e outros.


3) Fale um pouco da escolha do repertório? Foi opção unicamente sua ou teve a participação de outras pessoas?
O repertório foi composto através de muitas consultas com meu produtor (Arnaldo DeSouteiro) que, afinal de contas um dos papéis do produtor é exatamente este! Isto justifica a música do Jimi Hendrix com aquele caracter modernoso do JP Mendonça, o Led Zeppelin, a música do Luís Bonfá com o próprio ao violão, o tema do Arthur Maia que fiz o arranjo hindu e todas as outras.


4) Dom Um Romão, Ithamara Koorax, Alfredo Dias Gomes, o pessoal do Barão Vermelho... Além de abrilhantar um CD acrescentam sempre algo ao trabalho. Que aspectos você destacaria como os mais importantes das participações dos convidados?


Cada convidado participou com sua melhor faceta. Por exemplo: eu não convidaria um músico de Jazz para tocar numa faixa Heavy Metal simplesmente por ele não estar acostumado ou familiarizado com os detalhes daquele estilo. Não estou rotulando os músicos, pois também sou um deles, apenas apontando um fator muito claro. Thiago de Mello participou em sua própria música que tem um caracter folclórico, a ambiência fui eu quem dirigi. Guilherme Snard cantou uma faixa explorando ao máximo sua sonoridade grave e potente, Cláudio Infante foi perfeito tanto na faixa com tablas e pandeirão árabe quanto na bateria afro. E por aí vai.


5) Uma faixa em especial me impressionou pela sonoridade. Black Widow, e o que agradou-me mais foi um naipe de metais. A idéia foi sua? Fale um pouco mais deste arranjo? De quem foi a concepção, quem são os convidados?
Ah! Esta faixa é uma composição do Eumir Deodato, quem admiro muito, e eu fui um louco em desconstruir sua música. No original ela tem uma sonoridade latina à la Santana, com Tony Levin no baixo e meu arranjo já é mais descarado, no bom sentido (risos). Combinei um groove de Cabo Verde que tem o bumbo reto e o Cláudio Infante arrasou. Gravamos primeiro bateria e StickBass (10 cordas) onde fiz o groove de baixo e a harmonia ao mesmo tempo. Depois incluimos o Glauton Campello no Oberheim, o percussionista Laudir de Oliveira do grupo Chicago e o pessoal do sopro. Escrevi as linhas de trompa e meu amigo Diógenes de Souza me auxiliou na construção das vozes de Flugel horn, Oboé e Fagote. As intervenções de Flugel foram idéias do Arnaldo deSouteiro. Esta combinação, que eu já tinha em mente, de metais com madeiras também fez com que a faixa fique diferenciada. Eumir Deodato aprovou o arranjo... ele até brincou “eu toquei também”? (risos) Esta faixa está no Cd Friends From Brazil 2001, uma compilação da JSR para a Europa e Japão e tive o privilégio de tê-la remixada por um famoso DJ Europeu.


6) Sei que foram usados neste CD alguns instrumentos... "exóticos". A escolha deles foi visando a projeção internacional deste disco? Caracteriza-lo como "world music"?
Definitivamente não com este objetivo, mas por manter minha integridade musical. Não sou do tipo “chamar um quarteto de baixo, guitarra, bateria e sax e gravar um disco com a mesma sonoridade com todo mundo solando”. Isto me irrita. Quero música, não uma demonstração de técnicas. Coloquei em meu disco o multifacetado que sou. O músico não é o aquilo que ouve? Então ouça meu disco e me conhecerá. No disco há cítara, tablas, pedal steel, oboé, fagote, mellotron, frame drum, guira, derbak, baixo fretless de cordas duplas, ebow, um instrumento de percussão chamado “boca do mato” do Thiago de Mello e muito mais. Tudo isto por que queria uma determinada sonoridade. Como “Oil on Canvas”, as texturas, o foco, as sombras, tudo é importante. Não sou um virtuose, nem quero ser, então faço música para quem quer ouvir música, e não para músicos.

7) Como é a participação do baixo neste disco. Que tipo de instrumentos você utilizou e que "efeito" você esperava alcançar em cada faixa?
Usei todos os meus Bebês (risos). O Fender Marcus Miller Jazz Bass para slaps e fraseados, o Ibanez SR506 fretless de 6 cordas para melodias, o StickBass de 10 cordas para as coisas étnicas, o Vertical DiCarmo para as sonoridades mais próximas ao baixo acústico, o piccolo fretless do Cheruti para solos e contramelodias e finalmente para texturas o baixo fretless de cordas dobradas (8 ao total) em pares afinados em oitavas, quintas ou quartas justas conforme a composição. Usei o sistema de duas potências StudioR com caixas Selenium (duas caixas 1x15”, uma caixa 4x10”+horn e uma caixa subgrave 1x18”) microfonadas além de uma outra linha através de um preamp valvulado. Nos efeitos usei muita coisa, MuTron III, Cry Baby Dunlop, Octave Boss, Fuzz Big Muff, pedal de volume e outros “brinquedinhos” tais como o Ebow e o Hi-Ebow para o sustain infinito, um bottleneck, palhetas, uma dedeira tudo da Dunlop além do Funk Fingers, que apesar de estranho tem uma sonoridade maravilhosa. Consiste em duas baquetas atachadas aos dedos da mão direita para atacar as cordas, coisa do meu ídolo Tony Levin.


8) Qual a estratégia de divulgação deste CD no mercado internacional?
Esta pergunta eu transfiro ao meu produtor Arnaldo de Souteiro...

Arnaldo: "Não penso em artista como sinônimo de um único disco. Isto funciona na area pop, na qual se pode e se deve fazer trabalhos descartaveis. Num momento a bola da vez chama-se Backstreet Boys, no outro Spice Girls. Se acabarem, não farão falta prá ninguém e todo mundo (gravadora, empresários, produtores) já terá ganho muito dinheiro. Entao, todos ficam felizes – menos os artistas descartados, claro – e logo começam a inventar um novo produto.
Mas, em jazz, por exemplo, este tipo de comportamento não funciona. A não ser que seja para lançar um saxofonista que imite o David Sanborn, outro que imite o Michael Brecker, coisa que aliás já aconteceu várias vezes...inclusive com músicos brasileiros! Coitados! Acharam que virariam superstars e hoje estão sem gravadora, e nem conseguiram prestígio da crítica, nunca foram sequer citados numa Down Beat, numa Swing Journal, não conseguiram ser levados a sério...Tão ridículo quanto cantoras brasileiras que quiseram se consagrar nos EUA imitando os scats da Ella Fitzgerald, o fraseado da Sarah Vaughan, e até o peso da Carmen McRae...
No caso do Pescara, portanto, embora aparentemente estejamos preparando apenas um disco, na verdade estamos preparando o próprio artista para virar um produto. No melhor dos sentidos. E sem hipocrisia de falarmos em arte pela arte, porque isso nunca existiu. Caso contrário, Van Gogh não teria amputado a própria orelha, num ato de desespero porque não conseguia viver da sua arte, porque ninguém comprava suas obras. Isto é conserva dos ACMs da música, quem vem com esse papo é justamente quem mais fere códigos de ética e mais recebe jabá. É preciso que o artista, por melhor e mais espontaneo que seja, aceite virar um produto, porque ele tem que se vender, além de vender disco. Então, por isso não temos pressa no lançamento do CD do Pesca. Porque, enquanto o disco vai sendo concluido com o maior esmero possível, o artista vai sendo promovido através de outros trabalhos. Fazendo a turnê nacional do CD “Serenade In Blue”, da Ithamara, ele vem sendo visto, ao vivo, por um público enorme que pode se tornar também uma parte do futuro público dele. Tocando no CD “Lake of Perseverance”, do Dom Um, que está estourando em termos de crítica e de vendagem no mundo inteiro, milhares de pessoas já estão ouvindo o Pesca, ou pelo menos lendo seu nome nas principais revistas de música do mundo, e também em dezenas de sites importantes na Internet, como o All Music Guide.
Daqui a pouco vão começar a sair os remixes das faixas do “Lake” e, numa delas, o “Afro-Blue”, do Coltrane, eu pedi para que o DJ mantivesse a introdução original de baixo vertical-solo feita pelo Pesca.
O passo seguinte vai ser o lançamento do “Friends From Brazil 2001”, coletânea que inclui uma mixagem da musica “Black Widow” diferente da utilizada no disco dele Ou seja: o lançamento do CD do Pesca, que só deverá acontecer em meados de 2002, será a última etapa de um longo e cuidadoso processo.


9) Projetado para ser lançado no mercado internacional, o CD foge dos padrões aceitáveis da grande mídia. Parece que ninguém vê o instrumento como o principal canal da voz de um músico. Qual a estratégia para garantir uma boa divulgação aqui no Brasil?
A boa aceitação no mercado internacional e meu trabalho com um todo. Afinal eu não sou um cara que apareceu ontem e gravou um disco solo se auto-intitulando “grande músico e produtor” mas fica enclausurado em quatro paredes dando aulas o dia inteiro. Já toquei com Celso Fonseca abrindo shows para o Stanley Clarke no Palace lotado e no antigo Metropolitan do RJ. Já toquei e gravei com meu irmão Arthur Maia incluindo o show lotado do Canecão em 96 que passou na TVE do RJ. Acompanho a cantora Ithamara Koorax à (há) alguns anos viajando por muitos lugares, também o trabalho com o Dom Um Romão, o grupo de BRock Zero... tudo isto conta.


10) Aproveitando o gancho da pergunta anterior, você acredita que a melhor saída para o músico brasileiro é o aeroporto?
Para fazer uma tour no exterior é o meio mais rápido, não é? (risos)


11) Gravadoras e músicos muitas vezes vivem em conflito. Qual o caminho das pedras para realizar um trabalho adequado com as suas aspirações de músico e atrair o interesse de uma gravadora?
O melhor produtor que você possa contratar adequado ao seu próprio estilo musical.


12) O processo criativo incentiva cada vez mais a criatividade. Logo, depois de um CD normalmente muitos já pensam no próximo trabalho. Você já tem algo definido a este respeito ou existe algum outro projeto em mente?
Sou muito inquieto e já tenho projetado em meu computador ao menos uns dois discos, três livros prontos de técnica de contrabaixo e uns dois vídeo-aulas. Afora outros projetos.

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