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Review written by renowned Brazilian music critic and historian Tarik de Souza, for the daily newspaper "Jornal do Brasil", about the 2-CD set "A Trip To Brazil Vol.3: Back to Bossa", produced by Arnaldo DeSouteiro.
Review written by renowned Brazilian music critic and historian Tarik de Souza, for the daily newspaper "Jornal do Brasil", about the 2-CD set "A Trip To Brazil Vol.3: Back to Bossa", produced by Arnaldo DeSouteiro.
Review originally published on February 7, 2003
A bossa sobre novos pilares
Coletânea de raridades e clássicos evidencia um ritmo inesgotável
Tárik de Souza
Crítico do JB [07/FEV/2003]
Depois de escalar de Pelé a Quincy Jones, Stan Getz, Oscar Peterson, Caterina Valente, Rogério Duprat e até Brigitte Bardot nos discos anteriores, um novo banquete de raridades e hibridismos agregados em torno da bossa nova e adjacências desembarca no circuito internacional.
A coletânea dupla A trip to Brazil volume 3 - back to bossa (Universal), garimpada pelo produtor das anteriores, Arnaldo DeSouteiro, com minuciosas notas no encarte, mostra que o baú de acepipes é inesgotável, incluindo medalhões do ritmo como João Gilberto em interpretações menos óbvias. E ensina o quanto a bossa, acusada a princípio de americanizada, influenciou astros de todas as latitudes estéticas.
Sumidade do impressionismo jazzístico, o pianista Bill Evans abre e fecha a colheita recriando The dolphin, de outro mago dos teclados, Luis Eça, do Tamba Trio, que divide com a cantora Sylvia Telles uma releitura de Você e eu. Mais octanagem ainda no eletrizante encontro do Bossa 3 com o bailarino Lennie Dale e seu sotaque em O pato. Foi ele o coreógrafo da hélice gestual de Elis Regina, aqui numa abordagem do samba Tristeza, em registro francês de 1968. Ainda mais inusitada é a versão MPBossa da beatle Hey Jude, gravada em 1970, nos EUA, por Edu Lobo, Hermeto Pascoal, Airto Moreira, Oscar Castro Neves, Claudio Slon e Tião Neto.
Criado e terceirizado por Sérgio Mendes, o Bossa Rio que remodela outra beatle, Blackbird, é liderado pelo pianista Manfredo Fest e tem o baixo e bateria do segundo Bossa Três (Otávio Bailly Jr. e Ronnie Mesquita), mais os vocais de Pery Ribeiro e Gracinha Leporace. Mas o caminho inverso, de astros internacionais que mergulham (e às vezes quebram a cara) na bossa, é a face mais curiosa (e instrutiva) de A trip to Brazil.
Quem se lembra do falseteado Chris Montez, do hit setentista Call me? Ei-lo suingando na versão Keep talkin do Amazonas, de João Donato. Arranjador e ''trilheiro'' de alta reputação, Lalo Schifrin explora a elaborada harmonia de Rapaz de bem, de Johnny Alf. O ás do trombone de válvula Bob Brookmeyer esbalda-se nos requebros refinados do Samba de Orfeu, de Luis Bonfá, autor e intérprete do estilizado jogo de capoeira Bahia soul de 1968, sampleado no êxito das pistas Underwater love, do grupo Smoke in the city, em 1996. Faixa título do disco solo do vibrafone suntuoso de Milt Jackson, Jazz'n'samba é o jobiniano Só danço samba com um tratamento levemente funkeado. Já os acordes dobrados de Wes Montgomery sobre leve cama de cordas de Claus Ogerman (favorito de Jobim) deixam nas nuvens o clássico Insensatez.
Quase tudo é céu de brigadeiro na seleção, mas sempre rola alguma turbulência, como na estridência vocal da cantora soul Lorez Alexandria, que toma O barquinho (Little boat) errado. Ou num Wilson Simonal em sua fase descendente (Irmãos de sol).
Souteiro dribla os clichês ao convocar os medalhões em faixas menos conhecidas, como o João Gilberto da obscura e ingênua Rosinha, o Jobim da enigmática Dax rides, gravada por João Donato, ou o Baden Powell do improvisado Blues a volonté num duelo desgovernado com o scat da cantora francesa Janine de Waleyne. Jorge Ben (antes do Jor) aparece em três momentos. Como intérprete do raro tema afro Olari-olalá e como autor de Mas que nada, transcriado num harpsichord (instrumento de som próximo ao cravo) por uma banda liderada por Hank Jones e Oliver Nelson e Zazueira, por Luis Eça. A antologia desentoca jóias como Baiãozinho, de um iniciante Eumir Deodato na voz de Leny Andrade; a versão balançada de Vivo sonhando pelo esquecido bossanovista Luis Henrique; o belo O destino espera, o mais novo da seleta, do gaúcho Márcio Faraco, radicado na França, desconhecido aqui e apadrinhado de Chico Buarque; e um inesperado vôo funk/samba/jazz de Egberto Gismonti cevado por tumbadoras em O gato (1969).
O banquete de 47 faixas tem ainda duas versões de The dolphin por Bill Evans, que estreava o uso simultâneo de piano acústico e (hoje de novo na moda) o elétrico Fender Rhodes, o sambossa O que é que você vai fazer nesse carnaval?, com apito e teclados no estilo do Trio Azimuth, de enorme sucesso no exterior, e um show de arquitetura vocal do grupo Os Cariocas na magnífica escalada de Tão doce que é sal, de Marcos Vasconcellos e Pingarilho, autor e intérprete com Eumir Deodato de outra pérola pouco explorada, Samba do dom natural. A trip to Brazil viaja por uma cena rica e contraditório que refunda a bossa com outros alicerces.
A trip to Brazil volume 3 - back to bossa. Universal. Coletânea dupla. R$ 160 (preço em loja de importados).
Coletânea de raridades e clássicos evidencia um ritmo inesgotável
Tárik de Souza
Crítico do JB [07/FEV/2003]
Depois de escalar de Pelé a Quincy Jones, Stan Getz, Oscar Peterson, Caterina Valente, Rogério Duprat e até Brigitte Bardot nos discos anteriores, um novo banquete de raridades e hibridismos agregados em torno da bossa nova e adjacências desembarca no circuito internacional.
A coletânea dupla A trip to Brazil volume 3 - back to bossa (Universal), garimpada pelo produtor das anteriores, Arnaldo DeSouteiro, com minuciosas notas no encarte, mostra que o baú de acepipes é inesgotável, incluindo medalhões do ritmo como João Gilberto em interpretações menos óbvias. E ensina o quanto a bossa, acusada a princípio de americanizada, influenciou astros de todas as latitudes estéticas.
Sumidade do impressionismo jazzístico, o pianista Bill Evans abre e fecha a colheita recriando The dolphin, de outro mago dos teclados, Luis Eça, do Tamba Trio, que divide com a cantora Sylvia Telles uma releitura de Você e eu. Mais octanagem ainda no eletrizante encontro do Bossa 3 com o bailarino Lennie Dale e seu sotaque em O pato. Foi ele o coreógrafo da hélice gestual de Elis Regina, aqui numa abordagem do samba Tristeza, em registro francês de 1968. Ainda mais inusitada é a versão MPBossa da beatle Hey Jude, gravada em 1970, nos EUA, por Edu Lobo, Hermeto Pascoal, Airto Moreira, Oscar Castro Neves, Claudio Slon e Tião Neto.
Criado e terceirizado por Sérgio Mendes, o Bossa Rio que remodela outra beatle, Blackbird, é liderado pelo pianista Manfredo Fest e tem o baixo e bateria do segundo Bossa Três (Otávio Bailly Jr. e Ronnie Mesquita), mais os vocais de Pery Ribeiro e Gracinha Leporace. Mas o caminho inverso, de astros internacionais que mergulham (e às vezes quebram a cara) na bossa, é a face mais curiosa (e instrutiva) de A trip to Brazil.
Quem se lembra do falseteado Chris Montez, do hit setentista Call me? Ei-lo suingando na versão Keep talkin do Amazonas, de João Donato. Arranjador e ''trilheiro'' de alta reputação, Lalo Schifrin explora a elaborada harmonia de Rapaz de bem, de Johnny Alf. O ás do trombone de válvula Bob Brookmeyer esbalda-se nos requebros refinados do Samba de Orfeu, de Luis Bonfá, autor e intérprete do estilizado jogo de capoeira Bahia soul de 1968, sampleado no êxito das pistas Underwater love, do grupo Smoke in the city, em 1996. Faixa título do disco solo do vibrafone suntuoso de Milt Jackson, Jazz'n'samba é o jobiniano Só danço samba com um tratamento levemente funkeado. Já os acordes dobrados de Wes Montgomery sobre leve cama de cordas de Claus Ogerman (favorito de Jobim) deixam nas nuvens o clássico Insensatez.
Quase tudo é céu de brigadeiro na seleção, mas sempre rola alguma turbulência, como na estridência vocal da cantora soul Lorez Alexandria, que toma O barquinho (Little boat) errado. Ou num Wilson Simonal em sua fase descendente (Irmãos de sol).
Souteiro dribla os clichês ao convocar os medalhões em faixas menos conhecidas, como o João Gilberto da obscura e ingênua Rosinha, o Jobim da enigmática Dax rides, gravada por João Donato, ou o Baden Powell do improvisado Blues a volonté num duelo desgovernado com o scat da cantora francesa Janine de Waleyne. Jorge Ben (antes do Jor) aparece em três momentos. Como intérprete do raro tema afro Olari-olalá e como autor de Mas que nada, transcriado num harpsichord (instrumento de som próximo ao cravo) por uma banda liderada por Hank Jones e Oliver Nelson e Zazueira, por Luis Eça. A antologia desentoca jóias como Baiãozinho, de um iniciante Eumir Deodato na voz de Leny Andrade; a versão balançada de Vivo sonhando pelo esquecido bossanovista Luis Henrique; o belo O destino espera, o mais novo da seleta, do gaúcho Márcio Faraco, radicado na França, desconhecido aqui e apadrinhado de Chico Buarque; e um inesperado vôo funk/samba/jazz de Egberto Gismonti cevado por tumbadoras em O gato (1969).
O banquete de 47 faixas tem ainda duas versões de The dolphin por Bill Evans, que estreava o uso simultâneo de piano acústico e (hoje de novo na moda) o elétrico Fender Rhodes, o sambossa O que é que você vai fazer nesse carnaval?, com apito e teclados no estilo do Trio Azimuth, de enorme sucesso no exterior, e um show de arquitetura vocal do grupo Os Cariocas na magnífica escalada de Tão doce que é sal, de Marcos Vasconcellos e Pingarilho, autor e intérprete com Eumir Deodato de outra pérola pouco explorada, Samba do dom natural. A trip to Brazil viaja por uma cena rica e contraditório que refunda a bossa com outros alicerces.
A trip to Brazil volume 3 - back to bossa. Universal. Coletânea dupla. R$ 160 (preço em loja de importados).
[07/FEV/2003]
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